Fibromialgia, uma doença 'invisível'
iG Paulista - 01/07/2013 05h00 |
Inaê Miranda | igpaulista@rac.com.br
Foto: Érica Dezonne/AAN
O reumatologista André Luiz Luquini Pereira: doença não tem cura, mas pode ter efeitos
reduzidos
Braços, pernas, coluna. Não há parte do corpo que não possa doer. E junto com
as dores surgem sintomas como cansaço, dificuldade de concentração, ansiedade,
formigamentos e dormências, depressão, tontura e alterações intestinais. É
normalmente com esses relatos que os pacientes com fibromialgia chegam aos
consultórios médicos. As dores podem se arrastar por meses ou anos até que o
diagnóstico seja definido, já que com a ausência de lesão nos tecidos fica mais
difícil detectar o problema por meio de exames. Embora ainda não tenha sido
descoberta a cura, em muitos casos, os pacientes melhoram com o tempo e os
sintomas retrocedem quase totalmente.
Os médicos definem a
fibromialgia como uma síndrome — conjunto de sinais e sintomas — que se
manifesta com dores no corpo. No Brasil, ela atinge cerca de 3% da população.
Ocorre com mais frequência em mulheres do que homens e costuma surgir entre os
30 e 55 anos. Porém, existem casos em pessoas acima desta faixa etária e também
em crianças e adolescentes. Segundo o reumatologista e clínico geral da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), André Luiz Luquini Pereira, ainda
não existe uma causa definida da doença, mas há algumas pistas.
“Estudos mostram
que os pacientes apresentam uma sensibilidade maior à dor do que pessoas sem a
doença. É como se o cérebro das pessoas com fibromialgia interpretasse de forma
exagerada os estímulos, ativando todo o sistema nervoso para fazer a pessoa
sentir mais dor. É uma dor diferente, em que não há lesão no corpo, e, mesmo
assim, a pessoa sente dor”, explica o reumatologista. De acordo com Pereira, a
fibromialgia pode aparecer depois de eventos graves, como um trauma físico,
psicológico ou infecções graves. E situações como excesso de esforço físico,
exposição ao frio, estresse, ou infecções podem piorar as dores.
Isso
ocorre porque a interpretação da dor no cérebro sofre varias influências, entre
elas das emoções. Sentimentos como alegria e felicidade, por exemplo, podem
diminuir o desconforto da dor. A tristeza e a infelicidade podem aumentar este
desconforto. “Em parte isto é explicado pelos neurotransmissores — substâncias
químicas cerebrais que conectam as células nervosas —, como a serotonina e a
noradrenalina, que têm papel importante na interpretação da dor e na depressão”,
diz. Além de enfrentar as dores e todos os outros sintomas, o paciente enfrenta
dificuldades nos relacionamentos cotidianos, porque tornam-se inseguros quanto
ao desempenho pessoal, o que gera um estado crônico de revolta em relação a sua
saúde.
Diagnóstico difícil
Por se tratar de uma doença em
que não ocorre lesão dos tecidos, como inflamação ou degeneração, os exames
laboratoriais e exames de imagem não detectam nenhuma alteração, o que muitas
vezes retarda o diagnóstico, segundo os especialistas. “Na prática clínica, não
há como provar que a pessoa está sentindo dor crônica. A reação corporal é muito
diferente do que na dor aguda. O paciente não está agitado, suando frio,
gritando como acontece em um infarto ou uma cólica renal”, afirma o
reumatologista. As informações do paciente e o olhar atento do médico são
essenciais para se chegar à raiz do problema. “O médico pode pedir exames para
excluir doenças que se apresentam de forma semelhante à fibromialgia ou ainda
para detectar outros problemas que podem ocorrer junto e influenciar na sua
evolução.”
Tratamento
Apesar de ser considerada uma condição médica
crônica, que pode durar por toda a vida, os sintomas podem ser tratados e o
paciente pode voltar a ter qualidade de vida. Entre as medicações, os
antidepressivos e neuromoduladores são os mais indicados. Eles atuam aumentando
a quantidade de neurotransmissores no Sistema Nervoso Central. “Os
anti-inflamatórios e os analgésicos simples não são eficazes na fibromialgia,
pois não conseguem regular o cérebro para diminuir a sensação exagerada de dor,
além de aumentarem o risco de complicações gastrointestinais e renais”, alerta
Pereira.
As atividades físicas também apresentam excelentes
resultados no alívio das dores e dos sintomas da fibromialgia. Entre os mais
indicados estão os aeróbicos no solo, como caminhadas, ou na piscina, como
hidroginástica. Mas o médico alerta que os exercícios também devem ser feitos
seguindo as recomendações de um profissional. Outra medida considerada eficaz é
a psicoterapia cognitiva-comportamental. “Na fibromialgia, a terapia pode
auxiliar o paciente a entender e interpretar melhor suas atitudes frente à dor e
demais sintomas.”
Há 10 anos, a projetista Elisabete Forti convive
com a fibromialgia. Segundo ela, foram necessários cinco anos até que os
especialistas dessem o diagnóstico da doença. “Sentia dores nas costas, ia ao
ortopedista e ele tratava como coluna. Ia em outro médico e ele me dizia que era
bursite. Cada um falava uma coisa diferente. Mas era uma dor que não tinha
explicação. Doía o ombro, o pescoço, a lombar.”
Depois de receber o
diagnóstico de fibromialgia de um neurologista, Elisabete passou a tratar a
doença com medicações, atividades físicas e mudança na alimentação. “No começo,
quando tinha crises fortes, tomava muito remédio, alguns à base de morfina.
Depois, comecei a usar alimentos mais naturais e também faço pilates. Sinto que
melhorou bastante e eliminei 90% dos remédios. Às vezes, quando estou irritada,
triste, ou quando muda o tempo as dores aparecem mais fortes, mas estou
aprendendo a lidar com ela”, afirmou.
Texto reproduzido sob autorização.